João Calvino nasceu em 10 de Julho de 1509, na zona rural de Noyon, Picardia, na França, a uns 100 km de Paris. Quando ele nasceu Lutero já tinha 26 anos, e isso quer dizer que Calvino pertence à segunda geração de Reformadores. Seu pai era um advogado rico ligado ao alto clero da sua terra. Ele era um administrador financeiro do bispo católico da diocese de Noyon.
Calvino foi criado para ingressar no sacerdócio da Igreja Católica, e por isso foi enviado a Paris quando tinha 14 anos de idade para realizar os estudos preparatórios para sua carreira. Aos 17 anos Calvino graduou-se como mestre em Ciências Humanas e desenvolveu uma instrução sólida nos fundamentos da educação clássica, incluindo latim, lógica e filosofia.
Lá em Noyon, houve certo desentendimento entre O Pai de Calvino e o bispo, e agora seu Pai muda de Ideia e o direcionou para o estudo de direito na Universidade de Orléans (1528). Durante esse tempo em Orleans e em Bourges, Calvino aprendeu grego e estudou o poder do pensamento analítico e da argumentação persuasiva. Porém, em 1531 seu Pai veio a falecer, e então ele resolveu seguir, sua própria vocação. Agora, ele tinha 21 anos e mudou-se para Paris, em busca do estudo da literatura, especialmente a clássica. Mais tarde, retornou a Bourges, onde completou seus estudos em direito e recebeu o título de doutor (1532). No mesmo ano, Calvino publicou seu primeiro livro, que foi um comentário sobre a obra do filósofo romano Sêneca, “De Clementia”.
Nós não sabemos ao certo quando e como Calvino se tornou protestante. Mas, sua mudança deve ter sido resultado das influências dos seus novos estudos e dos ensinos de Martinho Lutero, a quem em uma carta o chama de “meu pai.” Calvino teve contato direto com as verdades da Reforma e depois que o evangelho lhe foi apresentado, sobreveio-lhe profunda convicção de pecado o que o impeliu a buscar alívio na graça de Deus. Ele mesmo diz que “por meio de uma conversão repentina, Deus subjugou e preparou sua mente para ser ensinada a respeito das coisas espirituais.” Em 1533 ele se declarou protestante e em novembro deste ano, Nicolas Cop, que era reitor da Universidade de Paris e amigo de Calvino, fez o discurso de abertura do novo período letivo. Este discurso foi na verdade “um apelo por uma reforma baseada no Novo Testamento, e um ataque corajoso aos teólogos daqueles dias”.
Logo correu o boato de que o discurso fora feito por Calvino, e então as perseguições começaram a aparecer, de modo que ele teve de fugir de Paris, no meio da noite, pela janela, usando um lençol como corda. Mas, apesar de sua vida inquieta, esteve três anos em Basiléia, e foi ali que, aos 26 anos de idade, publicou sua obra mais importante, e que viria a ser a obra mais importante da reforma protestante: a instituição da religião cristã, institutas. Obviamente, em sua primeira edição esse livro era pequeno, que continha uma declaração sistemática da verdade cristã defendida pelos protestantes.
Em uma das suas viagens para Estrasburgo em 1536, Calvino providencialmente, mudou de rota e fazendo uma volta por Genebra, onde pretendia passar apenas uma noite. Naqueles dias Genebra era uma cidade de cerca de treze mil habitantes, muito próspera, porém de baixo nível moral. A cidade havia conquistado sua independência numa guerra contra seu bispo católico, e agora se declarava protestante, sob a liderança do corajoso pregador Guilherme Farel. Farel sabia que aquela cidade, de vida desorganizada, necessitava urgentemente de uma obra poderosamente construtiva, tanto no terreno moral como no religioso.
Mas, ele sabia também que era incapaz de levar avante essa tarefa sozinho. Sem saber o que fazer, Farel ouviu a notícia de que naquela noite o notável reformador francês estava na cidade. Farel não hesitou, e foi procurar Calvino na certeza de que ali estava o homem mandado por Deus para reformar aquela cidade.
Farel empregou todas as suas forças para convencer Calvino a ficar naquele lugar, mas o grande desejo de Calvino era continuar estudando em um ambiente tranquilo. Vendo, então, que Calvino não lhe dava ouvido, Farel lançou uma terrível imprecação contra ele, dizendo que Deus o amaldiçoaria se ele se recusasse a atender a este chamado. Calvino ficou tão assustado com esta declaração que desistiu de sua viagem e decidiu ficar em Genebra.
Logo Calvino foi nomeado professor das Sagradas Escrituras, e, quatro meses depois, se tornou pastor da Catedral de Saint Pierre. Porém, iniciadas as suas atividades, em pouco tempo o trabalho de Calvino resultou em desastre. Pra começar Calvino e Farel redigiram uma confissão de fé e um juramento solene, através do qual queriam moldar a vida dos crentes da cidade de acordo com o padrão das Escrituras. Somado a isso eles proibiram as pessoas que viviam abertamente em pecado de participarem da ceia do Senhor, e isso resultou, na expulsão deles da cidade em 1538.
Calvino passou então três anos em Estrasburgo onde pastoreou uma igreja de refugiados franceses e onde escreveu seu primeiro comentário (que foi sobre a epístola aos Romanos). Ali ele publicou a segunda edição das Institutas e também encontrou sua amada esposa, Idelette de Buri, que era viúva de um anabatista e membro de sua congregação. Eles se casaram em 1540.
Idelette perdeu uma filha durante o nascimento e deu à luz um filho que morreu duas semanas após o nascimento. A própria Idelette veio a falecer de tuberculose em 1549, aos 40 anos de idade. Após isso, Calvino não mais se casou e pelo resto de sua vida se dedicou ao trabalho do Senhor.
Em Genebra as coisas iam de mal a pior e o Conselho Municipal de Genebra insistiu pra que ele voltasse. A princípio ele não queria voltar para aquela cidade maligna, onde ele morria diariamente várias vezes. Mas, depois de muita relutância, ele voltou em 1541. Porém, na sua volta ele tinha um propósito resoluto: ele queria tornar Genebra uma cidade cristã-modelo, uma comunidade cuja vida fosse realmente dirigida pelo palavra de Deus. Calvino queria que a cidade fosse de tal modo cristianizada que se tornasse uma fonte de inspiração e poder para o protestantismo em toda parte.
Mas, para que isso acontecesse era preciso ensinar a Palavra àquele povo, pois somente por meio da verdade de Deus é que as coisas poderiam mudar. E por isso Calvino torna-se um sustentáculo, pregando várias vezes aos domingos e em algumas semanas durante todos os dias. A sua exposição das Escrituras, verso por verso, semana após semana, e mesmo dia após dia, faria de Genebra um célebre marco da verdade do evangelho.
Os planos de Calvino para a Igreja incluíam um ministério educado e cuidadosamente escolhido. Foi assim que ele criou o ofício do moderno ministro protestante. Ele também cuidou do exercício efetivo da disciplina na Igreja por meio do chamado Consistório, que era composto dos presbíteros, cujo dever era vigiar a conduta do povo e dos ministros.
Calvino também pôs forte ênfase no exercício da misericórdia por intermédio dos diáconos que cuidavam dos pobres, das viúvas e dos necessitados. Os planos de Calvino quanto à educação foram inspirados por sua convicção de que a verdadeira religião e a educação estão inseparavelmente associadas. Segundo ele, a preservação e segurança da fé reformada exigiam tanto um povo educado quanto um ministério educado.
Por isso, ele estabeleceu em Genebra um sistema escolar livre e completo, que culminou com a Academia de Genebra, que recebia muitíssimos estrangeiros vindos de todas as partes da Europa para estudar Teologia e voltavam para suas cidades e países como ministros protestantes. Em pouco tempo, aquela cidade outrora turbulenta e dissoluta tornou-se notável por sua ordem, por sua cultura, por seu Cristianismo ardoroso e pelas condições morais excelentes. Genebra também se tornou uma cidadela de refúgio para os perseguidos por causa da Reforma. Para lá ia gente da França, da Holanda, da Alemanha, da Escócia e da Inglaterra e lá os refugiados encontravam um lar apropriado.
Genebra se tornou um lugar de preparo sólido para os líderes do protestante. Na sua Academia e no ambiente da cidade, foram preparados ministros devotados, instruídos e destemidos que se espalhavam por todas as partes e que voltavam aos seus países de origem, conhecendo plenamente as verdades da reforma. A exemplo disso temos John Knox, o grande reformador da Escócia.
Calvino entendia que “o Evangelho não é uma doutrina de língua, mas sim de vida.” Por isso, o calvinismo veio a ser o mais completo sistema teológico protestante, tendo por princípio básica soberania de Deus e suas implicações em todas as áreas da vida humana. Nas palavras de John Knox (discípulo de Calvino) Calvino fez de Genebra “a mais perfeita escola de Cristo na terra desde os apóstolos”.
Mas, é bom lembrar que esses resultados não foram alcançados sem dificuldades. Calvino era um homem fisicamente frágil e tinha muitos opositores. Ele chegou mesmo a enfrentar ameaças de morte. Mas, mesmo assim, ele nunca parou de pregar. Mas, enquanto pregava, as muitas dificuldades apareciam. Os Libertinos lhe causaram muita dor. Eles praticavam adultério abertamente e ainda assim desejavam participar da ceia do Senhor. Mas, Calvino não aceitava isso e por esta razão, um dia disciplinou alguns homens e os impediu de participar da Ceia. Mas o Conselho Municipal da Cidade anulou a decisão da igreja, e por isso estes homens foram à igreja a fim de participar da ceia.
Diz a história que eles chegaram armados, prontos para lutar. Nesse momento, João Calvino desceu do púlpito cheio de coragem, colocou-se na frente da mesa onde se dispunham os elementos da ceia do Senhor, e disse: “Vocês podem esmagar estas mãos, podem cortar fora estes braços, podem tirar minha vida, meu sangue é de vocês, podem derramá-lo, mas jamais me forçarão a dar as coisas sagradas ao profano e desonrar a mesa de meu Deus”.
Esta era a convicção inabalável deste bravo pregador.
Após muitas lutas e perseguições, Calvino morreu em 27 de maio de 1564 aos 54 anos, nos braços de Theodoro de Beza, que foi seu sucessor. As últimas palavras de Calvino foram: “Até quando, Senhor”. Ou seja, ele literalmente morreu citando a Bíblia sagrada que tantas vezes leu e expôs perante sua congregação.
Hoje, no século 21, nos encontramos em um momento conturbado na história do Cristianismo. Em muitos lugares a igreja está arruinada e precisa ser reformada. O pragmatismo encontrou solo fértil no meio evangélico e tem destruído as bases do protestantismo histórico.
Hoje a igreja está em buscas de métodos que agradam os pecadores. Muitos não pregam o que é certo, mas o que dá certo. Eles esquecem que o desejo de Deus é que seus ministros sejam encontrados fiéis. Deus quer homens como João Calvino, comprometidos com a fiel exposição da Palavra e com a glória da graça de Deus.
Por isso, nós precisamos urgentemente recuperar a centralidade da pregação bíblica no culto. Precisamos de pregadores que exaltam a glória de Deus, e cuja centralidade na pregação seja tão somente Cristo, e este crucificado. Mas, como diria Calvino, nós jamais iremos desempenhar com vigor essa ocupação, a menos que tenhamos a majestade de Deus diante dos nossos olhos. Oxalá que Deus nos levante nessa geração como homens que pregam somente a Escritura, cujo único objetivo na vida seja a glória de Deus e a edificação da sua igreja.
Soli Deo Gloria.
Pr. Dorisvan Cunha